quinta-feira, 30 de abril de 2009

Neonazismo Nos Anos 70 Em Porto Alegre, Capital A Frente Do Seu Tempo

MESMO muito antes de a expressão neonazismo ser cunhada eu, sempre avant guard, pude absorver tudo que o movimento tinha de mais destruidor. Minha escola, alemã até a raiz da franja ensebada de Hitler me prestou esse desfavor. Era tudo tão cinza e sombrio no Pastor Dohms que nem os urubus sobrevoariam os céus do colégio. Sei lá, de repente tinham medo de fuzis ou canhões ou não gostavam do cheiro de corpos queimados.
AGORA falando sério, era terrível. Pelo menos pra mim. 5% dos meus colegas concordava comigo. 50% não estava nem aí, aquele tipo de gentinha que veio à vida pra pastar. Os demais 45% era genuinamente feliz revirando aquele lixo. Fediam, eles próprios. O quadro da instituiçao era o clássico. Repressão a tudo e todos, filas em ordem de tamanho, pontualidade britânica era desprezada. Os professores tinham três caras. Cara 1: sou assim porque dependo desse emprego. Cara 2: adoro ser alemão recalcado. Cara 3: me observe e seja tão desprovido de vida interior e exterior como eu, esse fantasma. Acabou. A coisa era tão desmedida que lá pelo início dos anos 80 instalaram em todas as salas de aula, anfiteatro, salões e dependências do Prêsi (como meu irmão apelidou carinhosamente nossa escolinha) caixas de som, apelidadas de voz do além. Sempre, todos os dias, antes de começar a sessão de tortura o diretor tinha alguma pérola a dizer. Não raro éramos brindados com uma oração. Antes de uma aula de química é de cortar os pulsos. Adoravam passar o filme The Wall do Pink Floyd. Acho que acreditavam nos fazer ter medo das drogas, quá quá quá, nunca entendi se era essa a intenção dos imbecis. Pra mim importava mesmo era o ódio a instituições de ensino que passava na tela. Eu também queria queimar os livros e botar fogo na escola.
MEUS colegas me hostilizavam como podiam. Eu me defendia como podia. Briguei e me impus a professores e colegas até a 6ª série. O inferno na terra atendia por dois nomes, recreio e vestiário. Então fui me retraindo e acabei vencido pelo medo da crescente rejeição. Mas era tarde. A merda já tinha ido pro ventilador, meu caldo já tinha entornado e meu leite derramado. Eu contava os dias pra sair daquele lugar e nunca mais ver aqueles tipos preconceituosos, quadrados, retrógrados, castradores, cafonas, interioranos e obtusos. O sistema tinha me nocauteado.
SOBREVIVI, ufa ! Mas muito mal e as feridas estão aí. Caso contrário não escreveria um esboço daqueles anos inúteis. Durante 13 intermináveis anos fiz 2 amigos e tive uma paixão que provocou o terremoto devastador final. Foi o meu ground zero. Ainda odeio ele e sempre vou odiar. Sim, a vida da gente pode piorar. Eu sou do tipo que se arrepende do passado e não acredito em quem diz que não se arrepende.
FINALMENTE veio a noite de formatura. Foi meu melhor momento naquela espelunca que infelizmente ainda está de pé. Hoje numa versão bem mais light. Que nojo.
DEVERIA ter ido pra outro colégio. Você deve estar se perguntando o que aconteceu. Por que se infligir tudo isso ? Paralisia, medo, ignorância do mundo, um abobado preso numa bolha. Não sei bem onde estavam meus pais, se é que você me entende. Eu acreditava que um colégio novo poderia ser melhor, mas que os colegas seriam sempre aquele quadro tosco conhecido. Só soube que havia vida fora de Aushvitz no cursinho. Mas era tarde. Cantava com os Titãs : não vou me adaptar. E não me adaptei, nem no cursinho, nem na faculdade, nem em lugar nenhum.
São 14 anos de terapia. E esse é um dos assuntos que minha psiquiatra ouve pacientemente, repetidamente, por mais de uma década. Algum avanço, é certo, está sendo alcançado. Fechar essas feridas ? Só com um Alzheimer bem poderoso.
PS: esse texto era pra ser pequeno.

2 comentários:

  1. Ei... como assim eu não sabia de tudo isso??? Quer parar de falar abobrinha qdo a gente se encontra e contar mais desse passado escabroso please? Adorei e me identifiquei, especialmente com as partes "não vou me adaptar", "a merda já tinha ido pro ventilador" e "eu sou do tipo que se arrepende do passado e não acredito em quem diz que não se arrepende". Essa última foi roubada de mim, eu sei. Entrou na minha cabeça e roubou essa frase q tava lá prontinha só esperando ser dita, cara de pau tu hein Fê, pqp.

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  2. E não poderia ser diferente!Comecei a ler,imaginar os olhos claros,olhando bravamente na fila..ou sendo observado por todos,passos cadenciados...parei.Dei uma volta pela casa.Achei que nâo leria até a última frase.Me arrepiei!!!!!

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