segunda-feira, 11 de maio de 2009

MORRISSEY, MEU IGUAL A MIM FAVORITO

TENHO OUTROS IGUAIS A MIM. A Marina está em segundo lugar. Mas o Morrissey é o topo do topo do topo do podium e da minha própria imagem refletida há tanto tempo. No começo dessa história louca, minha amiga de colégio, Patrícia, foi fazer intercâmbio em Londres e trouxe de lá discos do The Smiths. Todas as letras e vocais eram dele. Dele ? Ou meu ? Ou meu e dele ? Bastou. Parecia que eu tinha escrito todas aquelas canções, foi muito desconsertante . Foi como entrar num buraco negro, sem nunca mais me importar com a saída. Nunca vi a luz no fim desse túnel. Thank god.
COMPREI TUDO QUE TINHA DISPONÍVEL DO MORRISSEY NO BRASIL. Todos discos, revistas, tudo. As capas dos discos e a imagem dele são trabalhadas com cuidado pelo próprio, maquiavelicamente. Construiu uma mitologia cuidadosa e sem furos ao seu redor. Como pode tudo nele/dele ser tão gay e tão adequadamente colocado. Ergueu em torno de si uma barreira que toda mídia tenta quebrar já sabendo que vai sofrer uma inevitável derrota. Mas eles tentam, sempre. Frost Morrissey. A língua afiada tem sempre a resposta que escalpela o interlocutor, em qualquer assunto, sobre qualquer pessoa. O desprezo por seus colegas de profissão já gerou todo tipo de confusão e desconforto. Ele mostrava nas entrevistas tudo que eu era e tudo que eu queria ser. Transforma(va) em arte tudo o que eu consigo apenas transformar em reclamação e silêncio. Faz do limão uma limonada azeda ou muito doce, irresistível. Transita entre o pop e o rock como bate o coração, como se respira, como a noite cai.
EU ACHO RIDÍCULO TER ÍDOLOS, LOGO EU. Mas o que eu posso fazer ? Tenho comportamento de fã quando se trata desse homem de olhos azuis e 51 anos. Tem gente que nasceu para o palco, eu nasci para a plateia. Isso me incomoda demais. Tanto como morrer sem nunca ter morado em NYC. E foi justamentei lá que eu vi o Morrissey ao vivo pela primeira vez. Por causa de um dia apenas já tinha perdido um show dele no Summer Stage do Central Park um ano antes. Foi no Beacon Theater. Era 29/02/1999. Dá pra acreditar - vinte e nove de fevereiro de mil novecentos e noventa e nove. Eu tava tão nervoso que do show não lembro ABSOLUTAMENTE nada. Só tenho guardada a cena de muito gelo seco e ele, lindo, de camisa azul e jeans. Que absurdo. Voltei pra Porto Alegre e um mês depois ele se apresentou aqui. O raio caiu duas vezes em mim. O show daqui eu lembro um pouco mais. Pela segunda vez na minha vida assisti a um show grudado no palco. Nas idas a NYC eu comprava horrores de coisas dele. Morrissey conheceu cedo seu poder de vendas e não deixa barato. Discos, singles, compilações, edições japonesas com uma música inédita, livros, dvds, entevistas gravadas, opções de diferentaes capas. Os fãs compram tudo mesmo. A American Express aplaude de pé.
APRENDI INGLÊS PRA ENTENDER O QUE AQUELAS PALAVRAS DIFÍCEIS ATÉ PARA OS BRITÂNICOS COMUNS QUERIAM DIZER. O Morrissey já foi apontado como o maior poeta inglês vivo. Quando eu fui pra Londres ficava, infantilmente e secretamente esperando que ele aparecesse naquela virada de esquina. Ele sempre está na midia do velho mundo e suas músicas tocam mais na europa. Aqui, por incompetência e preguiça dos programadores só toca velharia. Ele é um caso pra quem gosta de conhecer uma pessoa não pelos escândalos nem por entrevistas que não dizem nada. Está tudo no trabalho. Já ouvi dizerem que para ouvir Morrissey é preciso gastar um pouco de tempo, se dedicar e decifrar aquilo tudo. E assim é. As peças vão se encaixando e uma pessoa vai tomando forma por meio de canções. Os shows lotam por onde ele passa e o público tem sempre a mesma cara, a minha cara. É muito estranho. Vi meus semelhantes no saguão de espera em NYC e aqui na fila em Porto Alegre, à distância, sempre. Vejo os shows em DVD e eu estou lá também, eu sou aqueles caras e eles são eu. A plateia tem sempre a mesma cara e é igual em qualquer país. É impossível eu assistir ao último DVD e não chorar. Estranho essas minhas reações até hoje. Até acho meio engraçado, mas sei que, no fundo, é ridículo. É viver a vida através de outra pessoa que na verdade eu acho que conheço, mas só conheço efetivamente no pedestal que eu mesmo construí. Mas, sei lá, afinal, todo mundo precisa acreditar em alguma coisa. Por incrível que pareça, eu também sou gente, se isso dá um pouco de conforto e momentos bons não deve fazer tão mal. A realidade já é suficientemente pesada e sufocante. Black sky in the day time.
No meu quarto eu lia o que ele compunha, ouvia essa voz inexplicável que ele tem. Faço isso até hoje. O tempo todo. Acho, e espero, que nunca acabe. É quando eu sou exatamente eu, explícito, 110 %. Nunca, em nenhuma outra hora eu entro tão certeiramente em comunhão comigo mesmo, sozinho. Se eu conseguisse meditar, sei que seria assim. Quanto mais alto possível na hora certa, na altura baixa quando o consolo de uma voz amada está sempre ao alcance de um play. Que outra pessoa falando por mim de um jeito tão próprio e idêntico existiria. Ninguém. Meu lugar no mundo, já deslocado por natureza, ficaria orbitando sem sentido por aí, mais perdido ainda. Como uma estrela. De vez em quando acho que estou meio doente e me afasto dele por um mês ou mais. Fico um pouco culpado por que ele pode ficar ressentido, mas ele tá acostumado, é feito dessa matéria. ( tô ficando preocupado porque esse texto vai ser longo demais).
ENCONTREI MINHA PSIQUIATRA AQUI NO SHOW DE PORTO ALEGRE. Foi um choque bom. Vi que, com ela ali, eu estava no caminho certo. Não precisaria explicar um monte de coisas sobre mim. Minha confiança aumentou. Ela conhecia o trabalho do Morrissey e isso ajudava muito pra ela saber melhor quem eu era. O papo psiquiátrico sobre o Morrissey e minha obssessão já foi dissecado inúmeras vezes. Projeção, intolerância, saber que aquela pessoa é uma construção minha e não vai me decepcionar nunca, etc, etc, etc. Nada adianta. Yes, I am blind. Uns se drogam, jogam, comem, batem nos filhos. Eu tenho isso, essa coisa que não tem governo nem nunca terá. Que não tem vergonha nem nunca terá. Boy racer, we're gona kill this pretty thing.
A música é minha companheira de todas as horas. Entrou na minha vida muito cedo pelas mãos de meu pai. Até hoje ouço o gênio Chico Buarque como se fosse meu pai. É minha vida, se fosse só uma trilha sonora, acabaria em um momento. Comigo não. Eu acordo com ela e muitas vezes quando vou dormir ela continua me consolando, me embalando e quem trata de desligá-la é o timer. Chegou uma hora em que ouvir era pouco e tatuei a palavra music no meu braço. Desde então mesmo no silêncio ela está comigo. Música e Morrissey pra mim são sinônimos perfeitos. Morro de medo de ficar surdo. Não sei se suportaria.
IMORTAL NINGUÉM É. Eu penso na morte todos os minutos. Sei que as pessoas que eu gosto podem desaparecer sem sentido nem justiça de um segundo pro outro. Nessas horas eu tenho a certeza definitiva de que deus não existe me s mo. E se o Morrissey morresse ? E se ele estiver morto agora, enquanto escrevo ? Muitas vezes, do nada , eu penso isso - e se ele estiver morto ? Bem , daí a coisa vai ficar mais preta ainda. Acho que um novo tom de preto, mais escuro, vai surgir.
GOOD NIGHT AND THANK YOU.

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